LOCAL DO ÓCIO criação: Osmar Batista Leal

" Todo alimento sadio se colhe sem rede e sem laço"
( William Blake)

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Texto 4 - ( Pálidas' drinks - parte 2)



PÁLIDAS’ DRINKS

II

  “girl you gotta love your man”
    ( The doors)


    Lá fora a chuva aumentava, mas ali dentro parecia estar mais quente do que da última vez que visitei o local. Procurei uma mesa que ficasse  num canto afastado dos outros homens que bebiam suas cervejas.  Enfim, sentei-me para descansar o corpo. Porém, mentalmente, eu não conseguia relaxar.    
     “Na gaveta da pia? Debaixo do fogão? Atrás da geladeira? Ou será que eu fui pro quarto e escondi sob o colchão? Eu não consigo lembrar onde eu larguei a faca suja de sangue.”
  Observei as poucas mulheres que havia ali dentro naquela noite de chuva, tentando me esquecer dos pensamentos ruins. Nem uma delas notou a minha presença. Cada uma já bebia, acompanhada. A mulher    atrás do balcão que assistia a novela não parou de ver televisão  para  perguntar o que eu queria.
    “Se Libertina ainda estivesse aqui, me trataria de forma diferente... Porque ela não era igual às outras... Não era até que... Por que ela fez isso comigo ? Por que eu tive que fazer isso a ela?”   
       Logo, comecei a lembrar do dia em que entrei no Pálidas’ drinks pela primeira vez. Libertina veio, prontamente, me atender:
     -Oi  !
     -Oi -Respondi, com a cara fechada. Mas ela sabia exatamente o que eu vinha comprar . Um pouco de alegria.    
     - Você quer companhia? –Ela perguntou a mim
     - Você quer tomar uma dose? –Eu perguntei a ela.
     - Paga um Keep Cooler?
     - É claro.
     A garrafinha custava vinte reais, mas ela valia muito mais do que isso. Virou-se e foi até o balcão. Depois voltou com uma garrafinha, já pela metade. Não trazia copo.     
      -Você quer que eu sente bem pertinho de você ? –Ela disse para mim.        -Quero que você sente no meu colo! –Eu disse para ela.
      Delicadamente, ela sentou-se  onde eu sugeri. Bebeu mais um gole no gargalo e, em seguida despejou um pouco da bebida  debaixo da cadeira onde sentávamos.
     -Como é o seu nome?  
     - Libertina. E o seu?
     -Valdevino!             
     Ela riu. Bebeu novamente, despejou mais  bebida no chão e disse:
     -Bonito nome. O que quer dizer?
     -Não sei... Faz quanto tempo que você trabalha aqui?
     -Cheguei ontem ... Mas eu já trabalhei em várias casas.  
     -Veio de onde?
     - Você conhece alguma casa lá no Pinheirinho?
     - Várias. Mas eu nunca te vi lá.
     - Eu só fiquei duas noites!
   - Então é por isso. Faz três dias que não apareço para aqueles lados... Quantos anos você tem?
     -Estou completando dezenove, hoje!
     -Então quer dizer que está fazendo aniversário hoje?        
     - E o que tem isso?
     Sem saber o que responder, comecei a cantar:
   -Parabéns pra você, nesta data querida. Muitas felicidades, muitos anos de...
     Ela não gostou. Levantou-se do meu colo, sentou na cadeira ao lado e começou a chorar.    
       -Desculpe-me! –disse eu.
   -Não tem problema! -respondeu ela olhando para baixo enquanto despejava mais  bebida debaixo da cadeira.
       -Mas o que foi que eu fiz de errado?
     -Fui eu que fiz. Eu estraguei a minha vida... E você cantou como se estivesse me ironizando...
       -Não. Eu não estava. Eu estava cantando sério... Mas o que tem a sua vida?   
       - Não adianta eu contar. Você não vai me entender.
       - Mas pelo menos eu gostaria de escutar você.
       - Tem certeza?
       -Sim.
       Ela largou a garrafa sobre a mesa, levantou a cabeça, olhou-me nos olhos e disse:
       - Tem certeza que você quer mesmo me escutar? 
    De repente minha memória foi interrompida pelo barulho da chuva. A chuva que me acompanhara até ali, transformava-se la fora em tempestade. "Onde larguei o meu guarda-chuva"-pensei. 
    Continua...
       
   Texto: Osmar Batista Leal

    CONTINUA...




 

   









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